Aqui vai um segredo valioso, daqueles que a gente só conta no pé do ouvido: contar histórias para crianças também tem seus truques. Não pense que eu falo isso só por ser escritora e por, volta e meia, subir ao palco para contar as minhas. Não, não! É porque eu também sou madrinha, tia, amiga das crianças. Gosto de estar cercada de pequeninos e aprender com eles. Por isso, se hoje você e o seu filhote tem um encontro marcado para  “a hora da história”, preste atenção neste ritual mágico. E depois, me conte se os truques desta cartola funcionaram pra você também.

Primeiro de tudo: peça para o seu pequeno escolher o livro do dia antes da hora de dormir. E aqui vem a carta na manga: sem que ele saiba, leia o livro sozinho(a) algumas horas antes. Estude a história, conheça o que vai acontecer. Não precisa ler o livro inteiro, se não puder, mas experimente mergulhar um pouco.

Quando você se antecipa na leitura, você descobre onde estãoas brechas para fazer as brincadeiras com as crianças, em que páginas, em que momentos. Você pode pensar em efeitos sonorosvozes de personagens, em piadas no momento certo e, principalmente, perguntas curiosas para serem feitas, inserindo sempre a criança dentro da história.

Na semana passada fui visitar minha amiga-irmã Bianca Brandão, e ela me ela pediu de supetão que contasse a história “A Invasão da Banheira” para seu filho Benjamim, de 2 anos.  Eu sabia a história de cabo a rabo, já que sou a escritora. Mas o que Ben mais gostou não foi exatamente do que estava escrito ali. Foi do que eu inventei, o que improvisei na hora a partir da história!

 

Vou dar alguns exemplos. Neste livrinho maluquinho, os animais da floresta invadem a banheira da pequena Juju, porque as águas dos rios estão muito poluídas. Então, no meio da história, eu pedi ao Ben que apontasse qual daqueles bichinhos ele queria que aparecesse na hora do seu banho.  E depois, pedi que ele imitasse o barulho que o bicho faz! O Ben se divertia em responder, dava risada em participar.

Antes de passar cada página, eu também inventei uma espécie de jargão, quase um refrão musical. Cada vez que um bicho novo estava por aparecer, eu disparava um monte de perguntas:  “Seráaaa que é uma cobra? Seráaaa que é um elefante? Seráaaa que é um macaco?” . Ele gostou tanto disto que passou a me imitar, falando também: “Seráaaaaaa?”. A mãe do Ben me contou que, depois desse dia, ninguém pode contar a história para ele sem fazer o bendito “Seráaaaa..?”.

Por saber previamente o enredo da história, você não precisa ficar com os olhos no livro o tempo todo, lendo cada palavra. Você pode olhar para a criança, interagir, sorrir para ela. E isto faz muita diferença para prender a atenção dos pequenos leitores, principalmente, os que têm menos de cinco anos de idade. Com eles, você também pode usar um pouco mais o corpo – movimento de mãos, braços, fazer caretas – para interpretar os personagens, como fazem os atores. Quem disse que contar história não tem uma pequena porção de teatro?

E a última dica: acredite na sua própria intuição:  Que parte da história você acha que ele vai gostar mais? Que pergunta faria ele sorrir? Explore isto. E caso você não tenha tempo de ler o livro antecipadamente, simplesmente leia com ele e deixe-se surpreender com a história. Permita-se rir junto com ele, se emocionar, se entristecer, questionar: a leitura convida a esta viagem interior, ainda mais bem acompanhado.

Dito isso, a mágica acontece espontaneamente. Entre pais e filhos, nunca é uma simples leitura, mas uma criação em conjunto. Você inventa brincadeiras e a criança também. Ela chama  a sua atenção para algum detalhe, no texto ou na ilustração, e você aumenta a importância daquilo. 

De cada encontro vai brotar uma história nova, que nasce desse momento de troca, afeto e intimidade. 

Uma história tão de vocês, que autor nenhum neste mundo poderia escrever melhor, nem com o mesmo amor.

Boa hora da leitura para você hoje. E, depois, não esquece de me contar os seus próprios truques para que eu siga aprendendo.

 

Fonte:Ibahia