Preso na Operação Armadeira, o auditor fiscal Marco Aurélio Canal relatou temer por sua segurança após ter seu nome divulgado pelo ministro Gilmar Mendes, do STF (Supremo Tribunal Federal), no caso de dossiês sobre autoridades. Para se proteger, ele disse ter gravado documentos sigilosos da Receita Federal e distribuído a amigos e familiares para o caso de algo ocorrer com ele. O objetivo era que seu trabalho na Operação Lava Jato fosse preservado em caso de algum ato violento. A informação consta de uma escuta telefônica sigilosa feita pela Polícia Federal com autorização judicial, cuja transcrição a Folha teve acesso. Agentes viram no compartilhamento dos arquivos uma possibilidade de vazamento de informações sigilosas.
O auditor fiscal conversou sobre o tema com o ex-cunhado Carlos Elias Gonçalves, juiz em Teresópolis. “Tô na operação [Lava Jato] desde o início. Ele expôs o meu nome que tava incógnito até então. […] As pessoas que a gente mexe de núcleo político é pesado. Tu mexe com o PMDB [hoje MDB] do Rio. […] Eu não tô mais oculto no papel das operações. E eu tô muito preocupado porque já morreu muita gente ligada a essa operação e, sei lá”, disse o auditor, segundo a transcrição da PF. “Então eu tomei uma medida. Eu [fiz] backup [de] tudo. Todas essas incidências. Tudo desse trabalho Lava Jato. Essas incidências também embora não tenha participado diretamente”, afirmou Canal, sem deixar claro se fazia referência aos documentos sobre as 134 autoridades, entre elas Gilmar.
Ele afirmou ter repassado os documentos a quatro pessoas, entre familiares e amigos do trabalho. O diálogo sugere que o objetivo é preservar o trabalho caso ele seja alvo de algum atentado. “Se acontecer alguma coisa comigo cara, orientar imprensa, Polícia Federal, de você orientar de como fazer uma comunicação desses fatos, porque de certa forma a Receita não dá, como vocês têm, proteção. […] Não dá nem proteção institucional, tá todo mundo preocupado com a própria cadeira”, afirmou o auditor. “Eu acho que alguém tá dando é a minha cabeça”, afirmou ele. Canal também relata sua versão sobre o vazamento dos dados do ministro. Segundo ele conta ao ex-cunhado, os dados saíram da Receita por engano –versão semelhante à oficial.
“O colega errou. O colega da execução abriu o sigilo do dossiê de programação confundindo com um dossiê de atendimento e o contribuinte diligenciado teve acesso à informação. Foi um erro. Ele abriu o sigilo do processo errado. […] Mas não foi de dolo, porque teve acesso à análise. Se alguém de dentro quisesse vazar teve acesso à análise, não precisava ele se registrar dessa maneira. É um bom fiscal cara, um moleque bom. E assim, cometeu esse erro”, disse ele.
O ex-supervisor é suspeito de ter cobrado uma propina de R$ 4 milhões a dirigentes da Fetranspor (federação das empresas de ônibus do Rio de Janeiro) e 50 mil euros a Ricardo Rodrigues, acusado de fraudar fundos de pensão que se tornou delator. O advogado Fernando Martins, responsável pela defesa de Canal, não quis comentar a gravação. Ele reafirmou que a prisão de seu cliente é ilegal.