Ao que tudo indica, Donald Trump terá mais facilidade para aprovar medidas e implementar promessas neste governo do que em seu primeiro mandato –o seu Partido Republicano retomou o controle no Senado dos Estados Unidos nestas eleições, e tem grandes chances de manter a maioria na Câmara dos Representantes.

A perspectiva gera temor em alguns integrantes do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

O presidente eleito americano já disse que implementar sua controversa política de imigração será uma das suas primeiras prioridades. Nesse sentido, ele se comprometeu com a deportação em massa de imigrantes em situação irregular -sem detalhar como fará isso-, o fechamento de uma fronteira com o México e o fim do direito daqueles que nasceram no país de receber a cidadania americana.

Trump também indicou que deve rever uma série de políticas implementadas pelo governo Joe Biden na área de energia. Biden criou o Inflation Reduction Act, que dá incentivos fiscais a quem consumir produtos menos poluentes e prevê investimentos em energia limpa. A expectativa de analistas é que a questão energética e das fronteiras sejam tratadas pelo republicano logo no início do mandato.

Além disso, o presidente disse que pretende impor taxações a importações de outros países e reduzir tarifas no país. Precisará ainda negociar com o Congresso a continuidade do corte de impostos que fez em 2017.

Apesar de faltar detalhes à maneira como Trump pretende instituir suas promessas, boa parte delas precisará passar pelo crivo de senadores e dos deputados.

Um integrante do Itamaraty disse, sob anonimato, temer o que ele vê como caminho aberto para o republicano aprovar suas promessas. O receio é ainda maior se Trump resolver levar adiante algumas das políticas previstas no chamado Projeto 2025, espécie de guia conservador elaborado por aliados do presidente eleito.

Ali, há a previsão de extinguir o Ministério da Educação; enxugar a administração e contratar apenas aliados políticos; e eliminar expressões previstas em lei como “orientação sexual”.

O republicano negou durante a campanha estar comprometido com a agenda, e chegou a dizer no debate com Kamala Harris, sua adversária nas urnas, que o projeto não só não tinha nada a ver com ele, como ele nem sequer o tinha lido.

O receio de integrantes do governo brasileiro é de que ele a leve adiante de todo modo, distanciando ainda mais as suas políticas da gestão Lula.

O controle da maioria em ambos Senado e Câmara não é algo inédito para um presidente da República dos EUA.

Segundo pesquisa da Pew Research Center, 6 dos 21 presidentes desde Theodore Roosevelt, que governou no início do século passado, tiveram o controle do Congresso no primeiro mandato, mesmo que ele não tenha durado todo o governo. Os deputados são eleitos a cada dois anos, enquanto os senadores têm mandato de seis anos.

O próprio Trump, na sua primeira gestão, em 2017, governou com o controle dos senadores e dos deputados.

Caso o resultado na Câmara se confirme, a diferença é que Trump chegará à Casa Branca em 2025 como um presidente com mais poder e ascendência sobre seu partido do que há oito anos.

A analista Erin Covey, do tradicional Cook Political Report, diz que a configuração do Congresso atual será distinta da anterior não tanto em termos de números que assegurem a maioria, mas de composição.

“A Câmara dos Representantes e o Senado são muito mais alinhados ao Maga [sigla em inglês para “faça a América grandiosa novamente”, slogan do presidente eleito] hoje. A consequência é que republicanos moderados, que antes apresentavam ressalvas aos planos do presidente eleito, agora não estarão mais lá”, afirma ela.

Em outras palavras: Trump provavelmente terá menos entraves para levar adiante suas políticas. Do total de 100 cadeiras do Senado, o republicano garantiu até agora 53, o que representa uma maioria apertada, mas suficiente para aprovar projetos que exigem maioria simples.

O número não é suficiente para impedir que os democratas usem o chamado “filibuster”, mecanismo que a minoria pode usar para obstruir votações. A única forma de superá-lo é com 60 votos, algo que os republicanos não têm.

Ainda assim, a aprovação de juízes para a Suprema Corte americana e outras nomeações, que só requerem maioria simples, passarão sem maiores dificuldades. Além disso, em casos de empate, Trump ainda pode contar com o voto do vice-presidente eleito J.D Vance, que também atua como presidente do Senado.

Lá, há duas senadoras consideradas de linha mais moderada do que Trump: Susan Collins, do Maine, e Lisa Murkowski, do Alasca. Resta dúvidas, porém, se elas comprariam o desgaste de discordar do partido e se a eventual oposição que fizerem terá efeito.

Até a tarde deste sábado (9), os republicanos haviam conquistado 212 das 435 vagas da Câmara dos Representantes. São necessárias 218 cadeiras para ter a maioria. A expectativa é de que a contagem dos votos seja encerrada em breve.

Trump venceu a eleição nesta semana ao ganhar ao menos 301 votos dos delegados de 270 que precisaria para vencer. Ele será reconduzido ao cargo em janeiro com o melhor desempenho do Partido Republicano nas urnas em 20 anos, e além da perspectiva de maioria no Legislativo, também tem ascendência nos governos estaduais e na Suprema Corte.

No discurso de vitória, Trump afirmou que a América lhe deu um mandato “sem precedentes”.

 

Julia Chaib / Folha de São Paulo