Hoje é sexta-feira e como você sabe toda sexta o site News Infoco apresenta uma entrevista com um pré-candidato a deputado estadual com fortes ligações com Alagoinhas e região, os chamados “filhos da terra”. Já entrevistamos Paulo Cezar, Val Andrade, Ludmilla Fiscina e hoje é a vez do pré-candidato a deputado estadual pelo PT, Rosivaldo Leite. Proseamos sobre o futuro da agricultura familiar no município, na região, na Bahia e no Brasil. O papo foi muito bom, como você pode conferir a seguir.
News Infoco: Como foi sua trajetória de vida como menino de periferia da cidade, de jovem produtor rural e feirante a líder de movimento sindical da Agricultura Familiar?
Rosival Leite: Bom, eu tenho vivência tanto no campo, quanto na cidade, mas minha vida foi marcada pela produção agrícola. Nasci na cidade de Alagoinhas, no Barreiro, mas muito vinculado ao campo, tanto que começo minha vida profissional no Estevão como produtor de hortifrutigranjeiros, que é uma vocação do distrito, começo a comercializar na central de abastecimento minha própria produção juntamente com o que outros da comunidade produziam: Hortaliças e frutas. E lá também me casei. Começamos também a dinamizar na comunidade com atividades agroecológicas até com visitas técnicas de entidades europeias pelo projeto Semear. A infância na zona rural era comum ainda, há 40 anos a criança acompanhar os pais na lida do campo, em um turno oposto ao escolar, já se considerava o estudo algo importante para o futuro dos filhos. E a implantação do segundo grau no Estevão já foi uma luta do Sindicato da Agricultura Familiar, uma das maiores unidades escolares da zona rural na época. Mas eu mesmo tive uma formação escolar aqui na cidade e completei o segundo grau no antigo estadual. Então minha vida, a partir dos 16 anos, foi sempre plantando e vendendo na feira. Estevão, Calu, Papagaio, Narandiba, Rio Branco são referenciais nessa lida e têm algo em comum.
News Infoco: Quando começa então o associativismo e a atuação dos sindicatos?
Rosival Leite: Tudo foi um processo. Iniciamos com grupos de jovens, com organização em torno do futebol, tivemos na diretoria da associação por dois mandatos, tivemos a transição das delegacias sindicais regionais… Participei pouco da Pastoral da Terra, mas me inseri na Pastoral Familiar, então a gente vem desse ciclo formativo. Depois dessa década, meados dos anos 80 e 90, nós passamos ao desafio de organizar nosso povo, na produção, mas também em um processo que criasse a condição para se ter as políticas previdenciárias, se passou a tratar muito dessa pauta, o que trouxe uma circulação de recursos para a zona rural. A gente passa os anos 90 chegando ali aos 2000 com o processo de conhecer mais o movimento sindical e a ajudar a construir esse instrumento de luta importante. Eu fui do núcleo da delegacia sindical do Estevão, que é uma representação do sindicato mais próxima dos seus afiliados, onde são prestados praticamente todos os serviços oferecidos na sede. Trabalhei nessa articulação junto com Abimael que era o delegado, foi presidente do sindicato assim como Adelson Batista e continua até hoje no movimento. Pessoas que me ensinaram muito.
News Infoco: Houve um momento que nem havia secretaria de Agricultura nas prefeituras, depois veio um ciclo das secretarias com orçamento reduzido. Como você viu essas fases?
Rosival Leite: Nessa época a gente não tinha a Lei da Agricultura Familiar. O problema das secretarias de agricultura, onde elas existiam, e prevalece até hoje, ela é a prima pobre, é a que não tem estrutura, não tem um quadro de profissionais suficiente e com a condição de assistir o público alvo, que é uma questão geral não é só de Alagoinhas. A agricultura nunca foi vista como uma potencial área para desenvolver o município, nunca foi vista como importante economicamente. A partir de 2006 que a gente foi ter a Lei 11326 que começa a trazer um contexto de visibilidade dessa categoria e desse setor e da importância que ela tem na sociedade, não só para produzir alimento e gerar vida, mas como fator econômico promotor de desenvolvimento. A partir desse momento você tem um regramento para políticas e programas. A política de oferta de semente, hora de máquina e adubo, não seguia um planejamento, havia atrasos na operação, como o exemplo das máquinas que comprometia o ciclo natural da produção, tem que se obedecer certos períodos para plantio e não se conseguia atuar de forma ordenada para atender a essas exigências impostas pela natureza. Muitas vezes se distribuía sementes que não eram apropriadas para a região, quebrando com a cultura local e a tradição das comunidades. Existia muito esse problema de desordenar o calendário agrícola e poucos eram beneficiados, a maioria ficava a margem da ação pública, com muita interferência política. Em 2002, 2003 já vão se criando a possibilidade de acessar a assistência técnica, mas tudo isso ainda muito abaixo da demanda apresentada. Mas começa a ter o avanço de algumas ações desenvolvidas pelo Governo Federal e pelos estados. Em 2000, fechou-se esse ciclo assistemático, mas que permanece de forma pontual até hoje.
News Infoco: Nessa história como se inserem as ações da EBDA que agonizou e terminou sendo extinta?
Rosival Leite: A EBDA cumpriu um papel importante nessa caminhada. Na área da pesquisa, nós temos contribuições de técnicos valorosos, como a estação experimental de Aramari que cumpriu um papel importante para a pecuária regional. Cada território tinha sua estação experimental. A EBDA foi passando por um processo de baixa reposição dos seus quadros e com investimentos que não acompanharam o crescimento da demanda nem a mudança de perfil do próprio agricultor. Chegou a um momento que tinha muita capilaridade, mas escassez de funcionários. Ela foi extinta e se criou a BAHIATER já no primeiro mandato de Rui Costa, em 2015. Hoje existem os chamados Setafs, que é o Serviço Territorial da Agricultura Familiar e quando município faz o convênio são criados os Semafs, que é um embrião novo que tem dificuldades a serem superadas. Em Alagoinhas existe o SETAF para atender toda a região, localizado no antigo DERBA. Ele reúne a BAHIATER, a CAR e a CDA. A CAR cuida muito da questão agroindústria, são mais de 1800 agroindústrias na Bahia toda, só nos dois governos Rui Costa. Isso fica visível nas grandes feiras, aqui mesmo no Litoral Norte tem experiências fantásticas, seja com o Mel, seja com a fruticultura. A produção começa inclusive a ser exportada, como as cervejas de umbu, as cervejas de maracujá, oricuri. E para acessar recursos, pra agroindústria o Estado lança os editais, só no BAHIAPRODUTIVA já se está no 18º edital. Nesse caso, o processo associativo é fundamental, porque o Estado não pode beneficiar pessoa física. São projetos que chegam até R$ 50 mil. Tem também o pleito direto, onde a entidade se candidata para receber recursos da própria secretaria. E tem também as emendas parlamentares. Agora existe uma fila imensa e a capacidade de entrega é sempre menor. Aqui nós temos pelo Bahiaprodutiva o Cangula com a produção de frango, no Tombador já é ovos, no Papagaio, agroindústria para farinha, no Rio Branco é mel, também polpa de fruta, além kits de irrigação e outros equipamentos.
News Infoco: Como você enxerga o cenário da agricultura na atualidade, com um governo de orientação neoliberal?
Rosival Leite: Primeiro que a gente tinha um ministério que tratava exclusivamente da agricultura familiar, o MDA, então esse ministério é que tinha a capacidade financeira e de atuar implementando políticas públicas no Brasil inteiro, esse ministério cuidava do ATER que aqui no Estado eram mais de 100 mil famílias assistidas a partir do recurso nacional, tratava de todas as políticas de desenvolvimento do campo, tinha uma série de diretorias e superintendências que cuidavam de cada área específica da cadeia produtiva, isso atualmente se reduziu a uma simples área no ministério da agricultura, que está voltado hegemonicamente para o agronegócio. Passamos a ocupar uma sala com 8, 10 pessoas que respondem pela agricultura do Brasil inteiro. Por aí você já vê que se reduziu a pó a agricultura familiar. Na Bahia, que é um dos estados que mais desenvolve esse segmento, temos 693 mil famílias na agricultura familiar, no Brasil são 3,9 milhões de empreendimentos. Você aí percebe o potencial da Bahia nessa grande fábrica de produção de alimentos. Eu defendo as grandes indústrias… Mas não se percebe que a agricultura familiar é uma locomotiva e que com ações e políticas concretas a gente altera muito a realidade dos municípios. Nacionalmente, nós tivemos esse desastre de não ter mais investimentos nesse setor importante. Vindo para nossa cidade, tem políticas? Tem, mas ainda são insuficientes para atender a demanda que se apresenta. E temos que pensar regionalmente porque Alagoinhas não pode ser desassociada de Catu, de Inhambupe, que hoje é o maior produtor de laranja, que éramos nós. E a gente observa que o Governo do Estado cumpre seu papel dentro de um orçamento que é infinitamente menor que o da federação. O primeiro secretário ligado à agricultura familiar (Secretaria de Desenvolvimento Rural- SDR) foi Jerônimo Rodrigues, que depois foi para a Secretaria de Educação e hoje é pré-candidato ao Governo do Estado. Ele que criou esse programa Bahia Produtiva que é o principal vetor de fomento do setor no Estado. Teremos por agora uma chamada de edital para contemplar 40 mil famílias. Aqui em Alagoinhas, se não me engano, a agricultura representa se muito 2% do orçamento. Há um falso discurso de que o município não tem recurso, mas não tem para a agricultura familiar, porque quando você vai para outras áreas, você percebe que elas têm o recurso. Então a pergunta é: por que a gestão não cuida da agricultura familiar, por que não coloca sua parte? Devido sua importância deveríamos deter pelo menos 10% do orçamento.
News Infoco: Tudo que conversamos até agora foi no intuito de traçar o cenário onde devem incidir suas propostas para um eventual mandato como deputado Estadual. Então me fale sobre como você pretende atuar em favor desse segmento?
Rosival Leite: Eu fui candidato em 2018 com a defesa de ações estratégicas, não só para a agricultura familiar, embora seja minha principal bandeira. Tivemos um processo rico construído com lideranças do movimento organizado da sociedade, muito diferente da política tradicional. Eu sou um simples trabalhador, mas obtivemos 31977 votos, organizamos a campanha em 100 municípios, tivemos votos de 342 municípios. Isso resultado de uma atuação no Sintraf desde 2000 e fui coordenador da Fetraf por dois mandatos. Eu vivi também uma experiência fantástica, eu ajudei a escrever o Programa Nacional de Habitação Rural. Aqui em Alagoinhas nós temos como representante Adelson Filho, que me ajudou muito com as diretrizes do programa, para que só na Bahia 8 mil pessoas terem acesso à moradia no campo, em Alagoinhas foram 140 unidades. O problema é que no Governo Federal atual não existe mais orçamento para o programa. A agricultura familiar está desprovida de todas as políticas federais. A habitação no campo é uma defesa que eu vou carregar comigo. Como mero trabalhador poucos acreditaram que a gente pudesse chegar tão longe, eu tive as associações e os sindicatos e seis vereadores da agricultura familiar me acompanhando. Na eleição passada fizemos 40 vereadores ligados a essa pauta, aqui nós temos Adelson Filho que é suplente de vereador, temos junto conosco prefeitos que acreditam no segmento bem como secretários de agricultura. Estaremos esse ano em 200 municípios, isso um filho de Alagoinhas, agricultor, plantador de alface, com uma política autêntica, baseada na credibilidade de você acreditar nas propostas. A questão da saúde não podemos deixar de discutir, a saúde tem que ser prioridade, a saúde na comunidade, a saúde preventiva tanto na zona rural como na periferia das cidades. Vamos nos atentar para a segurança pública que está na ordem do dia. A segurança não é só a polícia, é a família e a igreja, são todos os elementos de promoção humana e da vida, tem todo um contexto que a gente precisa trabalhar. Essas três bandeiras por si só já é algo gigante e eu sempre gosto de ouvir, eu vou para os municípios, eu vou para as comunidades, eu ouço mais as pessoas do que falo. Claro que na condição de deputado estarei contribuindo com todos os assuntos relevantes para a sociedade e vamos montar uma equipe que possa dar as melhores respostas e assumir os melhores posicionamentos. Vislumbramos a perspectiva retomada do projeto iniciado pelo governo Lula, que buscou inserir um grande contingente de marginalizados da cidade e do campo, governando com as representações legítimas da sociedade. Para nós só existe esse caminho e estamos inseridos nesse projeto que mudou a realidade da governança no Brasil e fez história.
Por Paulo Dias para o News Infoco