Sem a toga de juiz federal que o cobriu nos últimos 22 anos de vida, Sérgio Moro falou ontem pela primeira vez como futuro ministro da Justiça e da Segurança Pública. Em uma hora e trinta minutos meia de entrevista, explicou as razões profissionais e pessoais que o levaram a aceitar o convite para integrar o governo do presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL) e homenageou a imprensa livre.

Na primeira e última entrevista coletiva dada à imprensa, nos cinco anos em que esteve à frente dos processos da Operação Lava Jato, Moro não deixou pergunta sem resposta: rebateu acusações de uso político das investigações e de perseguição ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, pontuou como foi o convite para assumir o ministério, defendeu Bolsonaro das críticas de extremista, falou em “convergências” e “divergências” de ideias e delineou suas prioridades para a Pasta, o combate à corrupção e ao crime organizado, em especial as facções criminosas.

“Não tenho nenhuma pretensão a concorrer a cargos eleitorais a subir em palanque”, garantiu Moro, ao tentar por fim à polêmica de que ele teria mudado de opinião. Em 2016, o juiz afirmou em entrevista ao Estado – a primeira à frente da Lava Jato – que “jamais entraria para a política”.

“Não contrariei afirmação que fiz há a anos ao Estado de S. Paulo, de que jamais entraria para a política. Na minha perspectiva, na minha visão, eu sigo para fazer um trabalho eminentemente técnico. Um trabalho técnico de um juiz a cargo desse ministério específico.”

A inédita entrevista começou na véspera: a Justiça Federal abriu credenciamento para a imprensa e informou que as perguntas seriam limitadas a uma pergunta por repórter de cada órgão de imprensa presente, e com número limitado, por ordem de chegada. Antes mesmo das 13h, profissionais de mais de 30 veículos de comunicação (TVs, rádios, jornais e sites) chegaram ao auditório da Justiça Federal, em Curitiba, com a perspectiva de falas curtas e respostas evasivas.

Exatamente às 16 horas, o horário marcado para início da entrevista, Moro iniciou sua fala com “esclarecimentos que gostaria de fazer”, um deles, voltado aos profissionais de imprensa presentes. “Desde que aceitei esse honrado convite para compor o Ministério da Justiça e da Segurança Pública, para mim tem sido uma despedida da magistratura e da Operação Lava Jato a cada dia”, afirmou Moro.

“Tenho recebido diversos pedidos de entrevistas de jornalistas alguns que já conheci durante a Operação Lava Jato e realizar essa coletiva foi a forma que eu reputei apropriada para atender todas essas solicitações individuais.” Principal artífice da maior operação de combate à corrupção do Brasil, Moro destacou o papel da imprensa. “Procurei fazer (a entrevista coletiva) não só pelo esclarecimento necessário para responder as questões, mas também, de certa forma, em homenagem ao trabalho que imprensa realizou durante toda a Operação Lava Jato.”

Para ele, a imprensa foi “pontualmente crítica” ao seu trabalho e à Lava Jato. “Não vou reconhecer o acerto de todas essas críticas, acho que parte delas não foram tão corretas, algumas talvez tenham sido injustas, mas é o papel da imprensa realizar essas críticas, não vejo problema. Faz parte de um ambiente de debate, de diálogo e de tolerância.”

Moro defendeu que a “liberdade de imprensa foi fundamental na Operação Lava Jato porque informou a população desses crimes que foram descobertos, investigados e punidos”. “Então essa entrevista tem também esse papel de render uma homenagem ao papel da imprensa.”

Estadão