Depois de exonerar Henrique Mandetta, Bolsonaro leva Sérgio Moro a pedir exoneração. Bolsonaro é maluco, ponto final. Mas se ele estiver certo? Bolsonaro é tosco, sem elegância, deselegante, no caso, rude, sofre de sincericídio. Tudo isso é verdade e contribui para essa conclusão simplista de que “ele é um louco que vai levar o país ao caos e que deve ser contido o quanto antes, perfeito, temos o pano de fundo para o impeachment”. Mas se Bolsonaro, apesar de ter um possível flerte com a milícia, no passado, for alguém com padrões morais firmes e de um alto patriotismo? Ter proximidade com milicianos não significa concordar com seus atos corruptos, pode apenas ter sido uma estratégia para ganhar simpatia e penetrar nas comunidades mais pobres, pode-se chamar isso de jogar com as regras do jogo, para alguém que nunca teve recursos para fazer campanha. Embora sua recente sinalização de oferta de cargos para o centrão preocupe. Mais uma vez vamos chegar a conclusão de que não existe nenhum santo nessa história.

Dito isso, apesar dessas supostas máculas, no mais, Bolsonaro pode ser, milhões acreditam nisso, um homem ético, que se guia por uma moralidade cristã e que quer de fato livrar o país da corrupção e levantar a bandeira do conservadorismo. Olhando por esse ângulo e com as informações privilegiadas que tem, ele pode ter visto, tanto em Mandetta quanto no Moro, figuras desalinhadas com seu projeto político e que estariam dispostas a fortalecer os times adversários, criando um divisionismo dentro governo. Será que, apesar da crise do coronavírus, esse não foi de fato o tempo hábil para se livrar de ambos? Mandetta revelou insubordinação e apresentou indícios de improbidade administrativa, além de já ter denúncia de envolvimento com corrupção em seu passado. Moro, de certa forma, foi insubmisso também, pois, se prendendo a uma promessa de carta branca, quis que sua decisão prevalecesse sobre a do presidente. Moro também tem pontos obscuros em sua vida pregressa. Os velhos fantasmas do Tacla Duran e do Banestado voltam para assombrá-lo, bem como sua decisão de não retroceder a Lava Jato aos tempos de FHC, a velha ligação com o PSDB.

A saída de Moro, ao mesmo tempo, foi envolta em várias contradições, pois disse que não foi comunicado da exoneração(a pedidos) de Maurício Valeixo, diretor da PF. Em uma nota, em seguida, ele afirma que o diretor de fato estava cansado das pressões do presidente, portanto a exoneração não ocorreu sem a sua ciência. Ele também redigiu texto afirmando que ficaria no cargo e, sem comunicar ao presidente, marcou a coletiva, divulgada pela Rede Globo com detalhes do conteúdo de sua futura fala, parecendo que foi tudo combinado. Deixar o governo em uma crise como esta demonstra uma falta de compromisso com a nação, incompatível com o cargo que exerce e uma completa ausência de solidariedade com presidente que vive ataques constantes de forças que destruíram o país. Parece que Moro fez uma opção justamente por essas forças nefastas e vai demonstrando que seu projeto não era de anticorrupção, mas sim, anti-PT.

Especula-se que Moro se apega a Valeixo e queria indicar seu substituto para contemplar apadrinhados do STF na PF. Moro teria receio de um futuro julgamento seu pela corte por condutas na Lava Jato. Porém a questão que gerou a crise foi a displicência na investigação de Adélio Bispo.  A tese de que a facada em Juiz de Fora foi ato de um lobo solitário exalou um mau cheiro de complô e traição. Além disso, existem aproximações de Moro com a ala progressista do país, sendo amigo íntimo de Joice Hasselman, ex-jornalista de renome da Joven Pan, e tem proximidade junto com sua mulher com o Instituto Lide – Grupo de Líderes Empresariais – vinculado a João Dória. Somando-se as queixas de falta de empenho na questão do porteiro do condomínio, que quis associar Bolsonaro ao caso Marielle.

Ficaram também mal vistas sua omissão quanto às prisões arbitrárias e abusivas de cidadãos por conta da quarentena, com cenas realmente lamentáveis e sua decisão de comprar tablets para os presos poderem se comunicar com suas respectivas famílias, na linha de leniência “bandido é vítima da sociedade”. Moro conta contra si ainda a brandura com que tratou denúncias contra Álvaro Dias no âmbito da Lava-Jato, levantando suspeita sobre sua simpatia pelo PSDB, o que viria a elucidar aquela foto em que ele aparece sorridente servindo água aos tucanos e se divertindo, como se fossem velhos amigos, com Aécio Neves. Para completar, sua mulher em entrevista declarou posição francamente abortista. Moro nunca aderiu também à diretriz armamentista do governo.

O mais grave de tudo, sem dúvida, foi ter feito um show midiático em sua saída para fazer denúncias gravíssimas de que Bolsonaro agia para interferir na Polícia Federal e afirmou ainda que o PT em momento algum adotou essa prática, o que é mais uma grande mentira. Parece ali, que Moro assumia claramente sua faceta política e iniciava sua candidatura a presidente para 2022. Destruiria o seu eventual mais forte adversário, enquanto fazia um afago a esquerda. Só que os youtubers conservadores derramaram uma chuva de matérias dando conta de interferência do PT na PF, como também se sabe que foram constantes os vazamentos de operações durante a Lava Jato, permitindo muita destruição de provas. Romeu Tuma Jr também rebateu a afirmação de Moro, sobre essa (inexistente) neutralidade do PT quanto à PF. Moro parece que tentou distorcer os fatos para evidenciar uma suposta impostura de Bolsonaro. Se fez isso, foi leviano.

Outra questão é que a lealdade dos ministros da justiça ao presidente da República na época do PT era total e que o diretor da PF era afinado, por sua vez, com o ministro da justiça. Augusto Aras, procurador Geral da República, foi ágil e pediu investigação do STF sobre as denúncias de Moro, que agora terá que prová-las. Para a Globo, ele cometeu a baixeza de apresentar conversas pessoais printadas, a mesma prática de que foi vítima pelo Intercept. Moro ficou rapidamente amiguinho da Globo, emissora que atenta contra a democracia, com desinformações constantes e propositais, contra o direito do povo de eleger seu presidente, de escolher uma agenda e um caminho de desenvolvimento e luta para impedir que projetos governamentais tenham êxito, comprometendo o futuro da nação. Uma empresa que sempre se locupletou de verbas publicitárias em troca de coberturas jornalísticas questionáveis e promove o empobrecimento cultural e o emburrecimento dos brasileiros.

Nessa saída, Moro se mostra muito alinhado com os inimigos de Bolsonaro e deu combustível para que estes fizessem o impeachment do presidente. Horas depois do pronunciamento de Moro, Joice Hasselmann já protocolava um pedido de impeachment na Câmara do Deputados, coincidência? Se Moro não tiver provas será a palavra dele contra a de Bolsonaro, interessante é que reiteradamente Moro afirmou que Bolsonaro não intervinha na PF, mudou de opinião segundo a conveniência do momento? Com tudo isso, ele deixa transparecer que via o governo Bolsonaro como um mero trampolim político para ir para o STF e, nos últimos tempos, para tentar voos até mais altos. No mínimo, ele desceu alguns degraus em seu patamar de moralidade. Saiu menor do que entrou. A verdade é implacável, ela está aí para todas as pessoas, por isso jamais é injusta. O Moro que deu as costas para Bolsonaro em um aeroporto antes da campanha presidencial, esse parece ser o verdadeiro Moro. Se isso for verdade, ele entrou no governo como uma espécie de infiltrado, um progressista em um ninho conservador. Se isso ocorreu de fato, ele agiu como um mero oportunista. Mas pode ser que Bolsonaro seja o vilão da história e que Moro agiu em nome dos mais elevados interesses da nação. O tempo dirá, se ele se aliar com Doria, FHC, saberemos que houve algo calculista e de má fé no seu ingresso no governo Bolsonaro.

Paulo Dias é jornalista, graduado pela UFBA, especializado em Pedagogia e mestre em Cultura e Literatura pela UNEB. Tem passagens por vários jornais e assessorias de comunicação em Alagoinhas e Salvador. Atualmente escreve para o site News Infoco